Impressões

Sempre associei o câncer à dor, à tristeza, ao sofrimento potencializado, e de repente, tudo o que eu mais temi (sentir dores, colher amostras de sangue, tomar injeções...) estava batendo à minha porta.

O sofrimento antecipado pelo meu próprio preconceito foi pior, muito pior do que todo o tratamento do linfoma. Imaginei situações amplamente dolorosas, internações e até mutilações. O medo foi o meu maior desafio.

Além do medo da dor física tive medo de causar sofrimento e preocupação às pessoas de meu convívio. Eu sempre fiz tudo certo em minha vida, tanto para não me machucar quanto para não desapontar quem sempre acreditou em mim. Já cheguei a esconder meu sofrimento para não causar essa mesma dor em pessoas que amo. E confesso: isso não me fez bem!

A vida tem seu próprio tempo, e por que não dizer também, seu próprio humor (melhor eu não especificar a cor desse humor). Sempre tentamos determinar nossos tempos, mas não é assim que funciona. Nossas escolhas vão até certo ponto, em muitos momentos somos obrigados a parar o que planejamos para resolver o que a vida nos impõe. Do contrário, lenta ou rapidamente a vida nos esmaga, provando-nos a nossa própria insignificância no universo.

Hoje posso dizer, com orgulho, que finalmente estou amadurecendo, deixando minha infância e passando como um relâmpago pela minha adolescência tardia, rumo à equiparação de minha idade emocional à idade cronológica.

Parei de me lamentar, de ter pena de minha própria vida. Aos poucos vou me construir sobre bases sólidas, estruturar meu pensamento e elencar meus objetivos a curto, médio e longo prazos.

Diversos desejos e idéias têm bombardeado minha mente, preciso registrar cada um deles, avaliar todos os seus aspectos positivos e negativos, sua viabilidade e importância para mim e para o mundo a fim de elencá-los e cumpri-los. Tal qual no movimento Sturm und Drang, preciso liberdade para minha mente sonhar e criar, para depois explorar, agir, tornar alguns desses anseios realidade, me tornando uma pessoa mais feliz e completa, sempre em busca da vida.

Tenho consciência de que para construir esse futuro feliz, preciso preencher lacunas de toda a minha vida, situações precisam ser esclarecidas para que a estrutura sólida aqui já mencionada realmente exista.

Foi necessário tornar-me paciente oncológica para me atentar aos meus próprios problemas, à minha própria vida até então infrutífera e sem objetivos reais. Todo o medo pré-diagnóstico foi extinto com a informação e o enfrentamento da doença. Essa experiência tem me mostrado, ou melhor, tem me provado que sou uma pessoa forte, que posso superar os maiores desafios existentes nesse mundo. Para isso preciso apenas estabelecer metas e cumpri-las à risca.