Para eu me lembrar:

"Descobri como é bom chegar quando se tem paciência. E para se chegar, onde quer que seja, aprendi que não é preciso dominar a força, mas a razão. É preciso, antes de mais nada, querer."

Amyr Klink

Linfoma de Hodgkin

"Linfoma é um câncer do sangue, potencialmente curável, que ocorre nos linfócitos, células do sistema linfático, que fazem parte da defesa natural do corpo contra infecções."

Pensamentos

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domingo, 24 de fevereiro de 2013

PALAVRAS DE ORDEM


Eu aproveito o poema de Romário Nogueira para iniciar um assunto que considero de suma importância. 

Por mais que um diagnóstico de câncer seja difícil, aterrorizante e envolva muitas incertezas, temos apenas duas opções: enfrentar ou desistir

"Desistir" nunca esteve nos meus mais remotos pensamentos.
"Enfrentar", é o que faço dia após dia. 

Para enfrentar, é preciso deixar apenas o instinto de preservação aflorar e comandar as ações. Lógico que não é fácil, mas está longe de ser impossível, pois é a nossa chance de vencer as adversidades e poder continuar a vida. 

Sei que muitas pessoas optam por não saber muito sobre as enfermidades pelas quais são atingidas, deixando isso a cargo dos médicos e demais profissionais de saúde que as atendem. Porém, quando começamos a entender as doenças que nos atingem, somos capazes de conseguir opções de tratamento, conseguir até mesmo tratamentos melhores, pois os 'nossos' médicos conseguem, num diálogo franco, informações sobre nossas reações, que dificilmente teriam sem a nossa contribuição. Aos poucos entendemos os resultados dos nossos hemogramas, o que é uma alteração significativa ou não na dosagem das enzimas hepáticas e outros marcadores, e com isso, contribuímos nos cuidados diários com a nossa própria saúde. Sabemos quando podemos comer verduras cruas (sempre esterilizadas antes do consumo) ou cozidas; quando precisamos ligar para o médico ou ir ao pronto atendimento; quando podemos ou não realizar determinadas atividades; quando precisamos ir à luta com a burocracia dos planos de saúde ou o sistema público; quando precisamos de ajuda profissional. Isso tudo faz parte do nosso dia-a-dia, não podemos negar e esperar que as soluções caiam do céu, mas quando nos conhecemos e conhecemos o assunto que precisamos resolver, os caminhos são mais curtos, mais tranquilos de serem percorridos, pois nos preparamos para eventualidades. 

Como em tudo, o conhecimento nos abre portas. Aliando o conhecimento da enfermidade ao autoconhecimento faremos, em conjunto com os médicos e os nossos familiares, as melhores escolhas. Não podemos abrir mão disso
 
Em resumo, temos muitos direitos:

Questionem os médicos - levem suas dúvidas anotadas num caderno ou agenda. 

Procurem outras opiniões médicas - é direito de todo paciente.

Procurem alternativas terapêuticas - protocolos de pesquisa clínica, protocolos quimioterápicos diferentes, medicações novas - como anticorpos monoclonais -, novos transplantes, etc. (mas não tratamentos alternativos)

Não aceitem a incerteza passivamente! 

o se acomodem!

FÉ NA VIDA!

sábado, 19 de janeiro de 2013

Exemplos

Eu tenho visto muitos exemplos de vida e coragem em pessoas tidas como frágeis.
Pessoas que lutam como gigantes mesmo tendo corpos pequenos e frágeis, com pouca ou muita idade, mas que galgam lugares incríveis em grandes batalhas.

Particularmente, eu não gosto do termo "guerreiros", mas pensando-se em batalhas e lutas, o termo é coerente. Todas as vezes em que ouço alguém usá-lo no contexto dos tratamentos oncológicos, entendo-o de outra forma, como uma necessidade, como uma manifestação do instinto de sobrevivência, de falta de opções. 

Nesses últimos dias, três dessas pessoas morreram. É, resolvi usar o verbo morrer, porque ficar 'tampando o Sol com a peneira' não nos leva a nada. A realidade é esta. Primeiro a prima da minha cunhada, Analu; depois Felipe, um menino de Maceió; e por fim, a inglesinha Alice Pyne, que ficou conhecida por seus atos solidários. 

É estranha a minha percepção atual frente à morte. Não sei se isso é um sinal de endurecimento, de distanciamento, de desapego, de desesperança ou de desânimo, mas não fiquei triste com suas mortes. Não tive a vontade de chorar que outrora me dominaria. Apesar do peso que esses acontecimentos têm, eles também significam a libertação dessas pessoas e dos seus. A libertação da grande prisão que a doença se tornou para elas. Às vezes eu me sinto presa pelo câncer, mas é bem raro, sempre foram fases muito breves em que tive minha liberdade tolhida pelos tratamentos, afinal, mesmo nas vezes em que fiquei internada, eu mesma tive de resolver várias coisas, principalmente burocráticas, em vários âmbitos. Sempre de pé, sempre no controle. Eu não sei o que é ficar totalmente à mercê de outros, sem conseguir nem mesmo me levantar de uma cama. 

Infelizmente, muitas pessoas não conseguem sequer expressar suas vontades, que dirá levantar-se de uma cama hospitalar, ou reivindicar direitos, negociar questões burocráticas e até mesmo sair do hospital carregando suas malas e dirigindo. Quando conto que no 1º transplante o carro ficava na garagem do flat, e que nos dias em que eu não tomava psicotrópicos eu dirigia até o comércio do bairro para que meus acompanhantes comprassem o que precisávamos, as pessoas ficam um tanto desconfiadas de que seja uma história de pescador. Mas é verdade, tenho várias testemunhas. E foi sempre assim comigo. Só tive duas internações em que não conseguia fazer nada, e que precisei pedir que meus familiares fossem me levar e buscar no hospital, nas demais eu estava em plenas condições. Teve uma em que eu saí do hospital sozinha, de táxi. Bizarro... real. Por que estou me gabando disso? Só para dizer que nem sempre o câncer é devastador e debilitante. É possível sim viver bem. Mas quando não se vive bem, a morte pode ser a saída mais digna. 

Dias atrás eu li algumas críticas de pessoas que tiveram câncer a respeito de uma obra de ficção exibida na TV em que a pessoa diagnosticada com câncer pediu para um amigo assassiná-la no auge de sua carreira artística, pois sabia que o seu tipo de câncer não tinha cura, que definharia e sofreria muito até morrer. Optou então por ser morta.

Assisti ainda no início da semana passada ao filme "Escolha de vida", que conta a história do final de vida da Dra. Anne Turner, médica inglesa que foi diagnosticada com paralisia supranuclear progressiva, uma doença degenerativa incurável e progressiva, que leva à morte lentamente, como um vegetal. Por causa desse prognóstico e da experiência que teve com a doença e morte de seu marido devido a uma outra doença também degenerativa, ela optou pelo suicídio assistido. Tal modalidade de morte não é aprovada na Inglaterra, então ela o fez na Suíça.

Questões delicadas e polêmicas, na maioria das vezes, evitadas e repudiadas pelos pacientes e seus familiares. Anos atrás eu também seria irredutivelmente contra, mas hoje já não penso dessa forma tão fechada. Não sou a favor do suicídio nem do homicídio, sou sempre a favor da vida. E como optar pela vida quando ela já não pode mais ser vivida? Como pedir que uma pessoa continue sofrendo, e não vivendo?
Eu 'vivo' pedindo às pessoas que não desistam, que busquem outras opções de tratamento, outras opiniões, que não se deixem abater pelos resultados de exames e interpretações de um único serviço médico, que mesmo com o pior prognóstico é possível encontrar uma saída, que apesar de tudo ser contra, se existir uma única chance, é a ela que devemos nos agarrar e lutar pela 'vida'. Em momento algum eu passo a mão na cabeça e choro junto a morte anunciada, a falta de esperança e muito menos o desespero. Como já escrevi, sou e estou sempre a favor da vida. Mas da vida que possa ser vivida, que dê alegrias, que tenha atividade, que tenha propósitos, e não da vida dolorosa, que inspire preocupação e desgaste a todos, que tire o sono, que cause angústia, que cause desespero e incerteza. É preciso saber viver, é preciso poder viver.

Também não posso deixar de observar que nem em todos os serviços médico-hospitalares se conta com equipes humanas, que proporcionem não só o melhor atendimento profissional, como o suporte emocional e acolhedor que tanto precisamos quando fragilizados, em perigo iminente. Como pedir a um paciente que além das dores físicas e incapacitantes, tem de receber cuidados não dignos nos hospitais mal utilizados do ponto de vista humano? Como pedir que tenham calma e coragem, se são mal tratados, se não têm todos os remédios que necessitam para sanar suas dores e infecções? Como pedir que uma pessoa sobreviva para continuar passando por tantas mazelas? Como dizer que ficar vivo nessas condições é melhor do que morrer?

Essas três mortes de que tive notícia na outra semana, foram de três pacientes com histórias completamente diferentes entre si. Uma mulher jovem com câncer de mama que teve um tratamento, segundo ela, equivocado, mutilante e que nos últimos tempos optou por ter qualidade de vida, e não mais tratamentos tão agressivos. Um menino do nordeste que foi fazer tratamento em São Paulo, teve recidiva, e agora, numa viagem de descanso do tratamento à sua terra natal, teve de ser internado às pressas, onde se constatou um avanço agressivo do tumor, que o levou à morte encefálica e por fim à morte clínica. E uma adolescente inglesa, que por vários anos lutou contra o Linfoma de Hodgkin, e há pelo menos dois anos não havia mais esperança de cura, mas a exemplo do filme "The Bucket List", fez a sua própria lista e com a ajuda de amigos, familiares e novos parceiros, colocou todos os seus desejos em prática, os quais foram de treinar sua nova cachorrinha para uma competição até a nadar com baleias no Canadá, o tempo todo perpassando pela conscientização das pessoas para se cadastrarem como doadoras de medula óssea e a angariar fundos para doar e beneficiar outros pacientes.

Muitas histórias, muitas questões importantes que na maior parte de nossa vida queremos evitar. E por que evitamos?

Por medo de nossas próprias respostas?
Por medo de pensar como será a nossa morte?
Por medo de sofrer?
Por medo de desejar a morte?
Por medo de nos sentirmos tentados ao suicídio?
Por medo de nos arriscarmos ao viver?
Por medo de nos frustrarmos?
Por medo de nós mesmos?

Medo... Essa palavra nos faz ficar parados no mesmo lugar. Só que o mundo está em movimento, o tempo está em movimento, então nossos corpos se movem mesmo com a nossa inação. E, se (não) vivemos por causa do medo, perdemos oportunidades preciosas, que jamais voltarão. 

Portanto, temos de ter coragem para VIVER A VIDA!

E para encerrar, FÉ NA VIDA!

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

1º mês com a medula do amor



Hoje, dia 25 de outubro de 2012, completam-se 30 dias da infusão das células-tronco doadas pelo meu tio amado. São 30 dias de muitas conquistas, de muitos olhares brilhantes, de muitas notícias boas, que não sei se algum dia conseguirei relatar de forma a passar todo o significado do que temos vivido nesses últimos tempos.

Há 4 anos, quando fui diagnosticada com linfoma, fiquei sem chão, com muito medo da doença e dos tratamentos pelos quais eu passaria, e isto pensando que seria apenas no tratamento proposto inicialmente. Mas com o correr do tempo, fui apresentada a tudo isso, e me controlando cada vez melhor, o que consegui ao buscar informações sobre esse universo paralelo que nós, pacientes, somos obrigados a frequentar.

Preciso relatar que nos 38 (trinta e oito) dias em que fiquei internada para o meu segundo transplante, não tive nem as reações esperadas pela equipe e por mim. Não tive nenhuma febre, nada de mucosite, diarreia, irritação da pele, absolutamente nada! Minhas taxas sanguíneas também se mantiveram em níveis seguros, de forma que as doações de plaquetas e sangue feitas em meu nome estão reponde os estoques dos bancos de sangue, de internações anteriores em que precisei de transfusões e servirão também a outros pacientes que passam por tratamentos semelhantes. 

Meu tio também não sentiu nenhuma dor ou desconforto devido à medicação que tomou durante 4 dias antes da doação/infusão das células-tronco. Ele fez a doação através do processo de aférese, cujo sangue é filtrado e somente as células-tronco são coletadas numa pequena bolsa de sangue. Sua doação durou pouco mais de 3 (três) horas. E três horas e meia depois, eu as recebi através de uma via do cateter que foi implantado para o transplante. A infusão levou menos de meia-hora, foi bem rápida e tranquila, sem qualquer intercorrência, com direito a conversarmos diversos assuntos relacionados ao tratamento, e até rirmos de certas situações e também de ouvir a história de quando um dos médicos da equipe foi buscar uma doação de medula óssea no exterior, da qual ele não desgrudou um segundo. A equipe presente era de 2 hematologistas, 1 enfermeira e 2 técnicos de enfermagem, mais eu e o meu tio. E transplante de medula não é cirurgia! Como disse a outra médica, ela não é cirurgiã, mas faz transplantes. 

É lógico que tive um enjoozinho ou outro, mas para quem já fez quimioterapia, foi fichinha. E foram episódios isolados, pois a prevenção com medicamentos recebidos em horários alternados para evitar náuseas e vômitos foi muito eficaz. Só me senti realmente cansada e desgastada na véspera do transplante, devido à TBI (radioterapia de corpo inteiro), pois além do trajeto de ida e volta de ambulância até o instituto de radiologia de outro hospital, fiquei cerca de 1 hora deitada na mesma posição, dentro do molde que foi feito para eu receber a dose de radiação deste tratamento, que foi uma parte bem importante do condicionamento para receber a infusão das células do meu tio. 

Como já publiquei aqui, a compatibilidade entre mim e o meu tio doador não é 100%, por isso que é um transplante alogênico aparentado haploidêntico (= parcialmente compatível, no mínimo 50%). A compatibilidade foi bem alta, de 85%. Os 15% que faltavam para a compatibilidade total foram excedidos pela dose de amor constante que sempre houve entre mim e o meu tio. Portanto, os 85% são na verdade 185%!

A doação foi muito rica em células-tronco, bem maior do que o mínimo necessário, o que acreditava-se poderia dar rapidamente algum tipo de reação no meu organismo, coisa que até hoje não ocorreu. Mas em algum momento pode aparecer, e é por isso que agora, de alta, passo em consulta pelo menos duas vezes por semana. E além de não ter tido ainda essas reações, a diminuição dos linfonodos é palpável, esperamos que internamente também esteja ocorrendo tal regressão. Um dos médicos chegou a falar que nós não fizemos transplante de verdade, que eu devo ter recebido um soro com corante no lugar das células-tronco, pois foi tudo muito “liso”. Lógico que é brincadeira, e os médicos também estão muito contentes com essa experiência.

Hoje foi o meu 6º dia em casa, com o meu piano, a minha cama, o meu chuveiro, o nosso relógio quase centenário – que eu chorei e conversei ao dar-lhe corda e acertar as badaladas... A casa está diferente, árida sem o meu peludo, mas é só agora no início, o tempo passará e logo o Moleque estará de volta – talvez latindo como cachorro caipira por causa das férias no interior.  Mas é a minha doce casinha, cheia de minhas bagunças, de meus livros, fotos, cadernos, e tudo mais que estou acostumada. Até cozinhar – que não é o meu forte – tem sido bom.

Mais do que dizer que estou muito bem, escrevi aqui para dizer que mesmo quando esperamos sofrer, podemos ser surpreendidos pela vida e passar muito bem por algo que é tido como difícil e dolorido. Esse transplante liso foi um conjunto de muitos presentes para mim depois desses quatro anos às idas e voltas com o Dr. Hodgkin. Foi uma oportunidade de crescimento interior por enfrentar mais uma vez os tratamentos com a cabeça cada vez mais erguida e até mesmo com tranquilidade; oportunidade de rever e até mesmo conviver com pessoas que há tempos não estavam muito próximas; oportunidade de ver que a vida não quer apenas me testar, mas sim dialogar e me mostrar que tudo pode mudar, que tudo tem seu lado positivo, e que não é sua meta me esmagar, mas me ajudar a crescer. 

A vida nova ainda tem restrições e muitos cuidados a se tomar, mas tem um sabor incrível, de liberdade, de felicidade, de plenitude. E mais do que voltar à vida normal, estou começando uma renovação da vida, tenho novos planos surgindo diariamente, e alguns já estão em andamento. 

sábado, 20 de outubro de 2012

LIBERDADE

Se pá, a palavra é: LIBERDADE!
Como diz alguém que conheço.

Tenho muito a pensar e repensar antes de escrever aqui, mas o fato é que há pessoas me enviando mensagens pedindo notícias, e embora eu ainda esteja extasiada com esse transplante que foi puro amor, devo contar a boa nova e deixar a todos os que têm acompanhado esse meu tratamento maluco a par das excelentes notícias e resultados mais do que promissores: tive alta e já estou em casa. 

Foi tudo muito mais do que tranqüilo, sem nada de intercorrências, nem mesmo as esperadas. 

Agradeço a todos, até mesmo àqueles que não conheço e que provavelmente nunca conhecerei, e que além de me acompanhar, têm torcido muito por minha recuperação, seja através de orações, pensamentos positivos, divulgação e adesão a campanhas de doações de plaquetas, inscrição como doadores de medula óssea, etc. As mensagens, telefonemas e visitas jamais imaginadas fizeram com que dias de reclusão, medicações e monitoramento ininterrupto passassem de uma maneira que eu não imaginava ser possível. Depois contarei detalhes, tanto dos tratamentos quanto das lindas e inesquecíveis demonstrações de solidariedade e força que recebi e continuo recebendo. Nada do que eu faça ou fale será o suficiente para agradecer, então só espero seguir os exemplos e retribuir esse carinho com ações semelhantes.

Abraços a todos e muita fé na vida!

C@rin

P.S.: Fé na vida engloba o instinto de preservação e luta pela própria vida aliada a tratamentos médicos e cuidados de toda a equipe de saúde que nos assiste com excelência e segurança, mais a nossa responsabilidade em fazer tudo corretamente. Fé na vida é sinônimo de amor à própria vida.