Para eu me lembrar:

"Descobri como é bom chegar quando se tem paciência. E para se chegar, onde quer que seja, aprendi que não é preciso dominar a força, mas a razão. É preciso, antes de mais nada, querer."

Amyr Klink

Linfoma de Hodgkin

"Linfoma é um câncer do sangue, potencialmente curável, que ocorre nos linfócitos, células do sistema linfático, que fazem parte da defesa natural do corpo contra infecções."

Pensamentos

sábado, 10 de abril de 2010

Quem está realmente vivo?

Estava olhando minha lista de amigos virtuais, lembrando de cada um, até mesmo os que não conheci, e constatei que alguns já não mais estão vivos neste planeta: Jaque, Nelson, Tadeu, Siro, Helbert... Robertinho, Nathan,  Ranyer Paulo, Felipe (cerumano), Bruna, Dora... Infelizmente, como todo paciente oncológico, fico pensando até quando estarei aqui... Até quando meus amigos irão lutar pela vida... Quem conseguirá a cura... Quem não a conseguirá... O que falta acontecer? Por que há pessoas que sofrem tanto, que recebem um castigo atrás do outro?

Sabe, tem horas em que isso oprime, faz com que o chão e toda a racionalidade embasada em dados técnicos e no bom prognóstico simplesmente desapareçam. Não sou pessimista, pelo contrário, procuro sempre o lado bom de tudo, mesmo que seja uma situação dolorosa, poderemos depreender algo e usar como exemplo em nossas vidas. Mas tem  horas em que o baixo astral aparece, questiona os motivos dessas provas pesadas, e as respostas dificilmente surgem. Há algumas teorias que fazem certo sentido, mas é preciso simplesmente acreditar, e não comprovar.

Engraçado, a maioria das pessoas se apega à religião na época em que ficam doentes, como se acreditar no alento espiritual fosse mais importante do que se tratar rigorosamente.  Eu não penso assim, não ajo assim. Fui educada à maneira antiga, tendo uma religião, a qual me foi apresentada, não imposta. Por muitos anos fui voluntária através dela, fiz boas amizades, aprendi a valorizar a vida e o ser humano, tenho muito a agradecer pelas oportunidades que a religião me ofereceu. Seus conceitos, no meu entendimento, são plausíveis, porém há alguns pontos que sempre discordei, e como em todo lugar em que há mais que uma pessoa, também há divergências. Não corri para a religião quando me vi doente, não busquei nela alento, ao contrário, busquei informação, não fé cega. Isso me fortaleceu, me fez submergir num campo do conhecimento que jamais me atraiu - saúde - e confesso que gostei.

Hoje eu queria ir a um seminário sobre Pedagogia Hospitalar, no Hospital do Câncer (AC Camargo), mas como será um evento com duração de 10 horas, e eu estou saindo da herpes zoster, achei melhor não ir, de vez em quando ainda sinto umas pontadas no ombro esquerdo, acho que o frio tem colaborado com isso. Até 2008, sempre que eventos como esse eram oferecidos a nós, professores da rede municipal de SP, eu nem lia a proposta do curso, pulava para a próxima publicação em busca de algo mais interessante. Atualmente é o oposto, esse tipo de assunto me atrai. Como já relatei tempos atrás, pretendo ampliar meu campo profissional, estou pesquisando cursos de graduação, extensão e pós-graduação na área da pedagogia hospitalar e musicoterapia, ainda não me decidi. Esse seminário seria uma oportunidade para ter contato com professores que trabalham em classes hospitalares e ouvir relatos de práticas, perceber o olhar entusiasmado (ou não) desses profissionais. 

Tudo o que acontece em nossas vidas deve ser aproveitado, ser refletido. A experiência do câncer me fez abrir os olhos para muitos assuntos até então ignorados por mim, coisas que eu considerava irrelevantes, mas que na verdade são muito importantes, mesmo as pequenas. Nunca me interessei em incentivar a doação de órgãos, sangue, medula óssea. Nunca me importei em conversar com pessoas desconhecidas para dar-lhes apoio nas horas de dor e incerteza. Nunca pensei que a vida fosse tão frágil. À medida que essas questões afloraram, senti a necessidade de fazer algo para auxiliar pessoas em situações semelhantes à minha durante os tratamentos, e acho que meu caminho é no atendimento educacional durante os tratamentos. Tenho consciência de que o ambiente hospitalar é muitas vezes cruel e injusto, e é exatamente por isso, que estou muito inclinada a mudar meu foco profissional para esse ambiente, a fim de ajudar a tornar a estada nesses lugares menos dolorosa, entretendo e ao mesmo tempo ensinando, que é o que uma professora deve fazer.


A acomodação se instalou na minha vida, mudar hábitos, tirar ransos é muito difícil (mas não impossível). Começo a pensar que permanecer nos mesmos lugares, nas mesmas funções, ano após ano repetindo a vida, tem sido uma rotina enfadonha. Rotina é bom, norteia nossas vidas, mas sair dela, adquirir novos conhecimentos, ampliar os horizontes é ainda melhor. A vida requer movimento, e não movimento constante, uniforme, repetitivo, mas movimentos variados, crescentes, inovadores. Até o mar sai da rotina e de vez em quando inova, cresce, invade não só as praias, mas também as calçadas e ruas...Pensando no modo como vinha arrastando minha vida e nas possibilidades, pergunto: Quem está realmente vivo?

2 comentários:

  1. Belo texto! Infelizmente o câncer tem essa característica cruel. Interessante a forma como vc reage, o racionalismo, o pragmatismo sem perder de vista o próximo. Sempre achei tb que a religião deve libertar e não apenas servir de asilo para ficarmos sob o abrigo da fé cega, muitas vezes choramingando. Saúde, Bjs.

    ResponderExcluir
  2. Identifiquei-me com seu texto em vários pontos: religião, mudança, mais interesse pelos problemas alheios e, finalmente, um trabalho relacionado à área médica. Só que no meu caso, penso em voluntariado

    Bjs

    ResponderExcluir

Olá, amigo!

Por favor, pode postar como anônimo, mas assine a mensagem para eu saber quem a escreveu. Todos os comentários são muito bem-vindos.

Abraços

C@rin